O ex-juiz federal Sérgio Moro assumiu o Ministério da Justiça em janeiro do ano passado com o cartaz de superministro. Alçado a herói nacional pela atuação na operação Lava Jato, ele largou a magistratura, fez várias exigências antes de aceitar o cargo e foi atendido. Entre elas, o controle do Coaf e a incorporação do Ministério da Segurança Pública. Dizia-se que o ministro ia ter carta branca e muita autonomia. Mas a história mostrou o contrário.
Dezesseis meses depois, Moro viu o presidente Jair Bolsonaro passar por cima dele várias vezes. Perdeu o Coaf, foi ameaçado de ficar sem a Segurança Pública, viu o seu poder ser menosprezado publicamente pelo chefe mais de uma vez, teve interferência ilegal na Lava Jato revelada e sofreu derrotas importantes no Congresso Nacional e Supremo Tribunal de Justiça (STF).
Por último, nesta quinta-feira, foi comunicado por Bolsonaro de que teria o aliado Maurício Valeixo afastado do comando da Polícia Federal. Foi a gota d´água. Moro, enfim, reagiu a uma atitude contrária do presidente e pediu demissão. O governo ainda tenta fazê-lo desistir da ideia.
Abaixo, um resumo dos episódios que desgastaram Moro no governo Bolsonaro.
Pacote anticrime
Moro viu o STF derrubar a prisão em segunda instância, que proporcionou, entre outras, a liberdade do ex-presidente Lula. O ministro é contra a medida e tenta, junto ao Congresso, a aprovação de uma lei que permita a execução antecipada da pena.
Das 38 sugestões de veto enviadas por Moro ao pacote anticrime, apenas 4 foram atendidas por Bolsonaro. O presidente declarou que o pacote não era prioridade do governo. O projeto, aprovado pelo Congresso e sancionado por Bolsonaro, não permitiu a ampliação de causas excludentes de ilicitude, que poderia isentar de punições policiais que matassem em serviço. Esse era um dos desejos de Moro.
Bolsonaro não vetou do pacote anticrime o juiz de garantias, que divide os processos penais entre dois juízes. Moro havia criticado a medida antes, mas foi ignorado pelo chefe.
Vaga no STF
O presidente disse em entrevista que tinha oferecido a Moro vaga no STF ao convidá-lo para o Ministério da Justiça, mas voltou atrás e negou que tivesse feito a proposta. Depois, disse que indicaria um evangélico para o cargo. Até 2022, Bolsonaro pode indicar dois juízes para o tribunal.
Vaza Jato
O site Intercept Brasil divulgou mensagens de celular que revelam que Moro ajudou a Promotoria na operação Lava Jato, o que é ilegal. O caso ficou conhecido como “Vaza Jato”. Após a divulgação das mensagens, Bolsonaro disse que confiava em Moro, mas não 100%.
Moro disse que iria destruir as mensagens quando foram presos os suspeitos de terem “hackeado” ele e outras autoridades. Bolsonaro disse que a decisão não cabia ao subordinado.
Um Ministério a menos
Bolsonaro acenou com a possibilidade de recriar o Ministério da Segurança Pública, que hoje está subordinado a Moro. A medida diminuiria os poderes do ex-juiz e tiraria uma das maiores vedetes da gestão dele – a diminuição do número dos homicídios no país, iniciada no governo Temer.
Mudança na Polícia Federal
Contrariando a direção da Polícia Federal, Jair Bolsonaro substituiu Ricardo Saadi por Alexandre Saraiva na Superintendência do órgão no Rio de Janeiro. A direção da PF tinha indicado Carlos Oliveira Sousa, superintendente em Pernambuco. A corporação reagiu. Bolsonaro disse que cabia a ele e não a Moro fazer nomeações no órgão.
Perda do Coaf
O comando do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) foi umas das exigências de Moro para ser ministro. Bolsonaro tirou o órgão da Economia e passou para a Justiça. Mas o Congresso devolveu o Coaf ao ministério original. Depois, o órgão foi transferido novamente, desta vez para o Banco Central. O chefe do banco, aliado de Moro, Roberto Leal, foi trocado por Ricardo Liáo.
Derrotas
Moro sugeriu o limite de posse de duas armas por pessoa, mas o decreto foi aprovado liberando até quatro.
Depois de Moro titubear sobre as candidaturas laranjas na última eleição, dizendo que só iria investigar o caso se “houvesse necessidade”, Bolsonaro determinou abertura das investigações sobre o caso.
Bolsonaro mandou Moro demitir do Ministério Ilzona Szabó, especialista em segurança pública contrária ao afrouxamento das regras de acesso a armas. Ela tinha sido convidada por Moro.